terça-feira, 24 de abril de 2007

a epidural

A abordagem hoje é sobre um procedimento, considerado por muitos a grande invenção da obstetrícia moderna. A epidural.
Por muitos considerada como a salvadora do sofrimento da mulher, é vista actualmente como a grande inimiga da mulher. Uma silenciosa atitude que destroi a mulher em quase toda a sua dignidade.
Mas passemos de facto a tecer algumas considerações sobre a famosa epidural. A epidural consiste na colocação de um cateter fino, conduzido através de uma agulha manderil (condutora), num espaço virtual (porque ele efectivamente não existe), entre duas membranas, epidural e dura-mater, duas das três membranas que rodeiam o tubo neural onde se encontra a espinal medula. O médico, anestesista, apercebe-se doespaço epidural através da percepção da criação de uma pressão negativa resultante do empurrar da agulha condutora junto da segunda membrana o que de seguida o faz colocar o tal cateter neste espaço identificado. Este procedimento, puramente médico, tem como objectivo bloquear as vias sensitivas, através da injecção de um anestésico neste espaço, junto das inserções neuronais, a nível das vértebras L3 e L4 (ou mais acima).
Todos sabemos que a dor é uma sensação, desagradável, é certo, mas não deixa de ser uma sensação. Ora se pudermos bloqueá-la, obteremos um estado de ausência de dor (independentemente de ela existir e continuar a ser representativa de modificações ou alterações fisiológicas).
Penso também ser correcto referir que a dor pode ser resultante de alterações patológicas, isto é, do aparecimento de uma doença como por exemplo o cancro, mas também o é como resultante de alterações fisiológicas momentâneas, mas que não é sinónimo de doença, como por exemplo as dores menstruais ou as dores de parto. Aqui, porque efectivamente a pessoa não está doente, ao contrário do que por vezes se quer fazer crer, mas há algo momentâneo alterado. Muitos dos actuais clínicos referem que este tipo de dor é fundamental existir porque se trata de um relógio biológico que transmite informações permanentes sem colocar em risco a vida ou integridade da pessoa.
Quando se fala de um acto médico puro deve-se considerar algumas coisas importantes e que a meu ver nem sempre são salvaguardadas que é a correcta informação das vantagens, desvantagens e riscos.
Vantagens, como se viu em cima é de bloquear a sensação da dor e assim removê-la da percepção da mãe. Riscos são vários e normalmente a cada um corresponde uma ou mais desvantagem.
Assim, dos mais significativos temos: Um dos riscos é o cateter não ficar colocado no espaço epidural, o que resulta na mulher continuar com dor e ter que se submeter a nova colocação para que desta vez fique bem colocado (claro que não vou referir o número de picadas, que é em número variável, por vezes necessárias para se determinar o espaço ou o acesso mais facilitado). Um outro risco é a possibilidade de se furar a dura-mater (membrana logo a seguir) e daqui resulta a saída de liquido cefalo-raquideo (procedimento utilizado na punção lombar para determinar se há meningite, por exemplo), o que resulta permanentes e intensas cefaleias (dores de cabeça) que se tentam corrigir com a administração de análgesicos potentes e que pode obrigar a mulher permanecer deitada até 48 horas após o parto (no fundo cura-se uma dor, mas provoca-se outra mais duradora no tempo). Um outro risco é o facto de o cateter ficar virado para um dos lados, o que resulta em uma parte ou zona do corpo ficar bloqueada e sem dor e a outra ficar com dor. Um outro risco é poder ocorrer uma pequena hemorragia no local, que por sua vez tem implicações devido à acumulação de sangue no local e sua absorção corporal. Um outro risco, resulta do facto que a agulha ao passar por tecidos humanos também passa e lesa artérias e veias, que como já vimos podem resultar em hemorragia, mas que se forem próximos da raiz nervosa podem absorver os agentes anestésicos administrados (com base em agentes morfinicos) e que podem desenvolver reacções medicamentosas, que na sua forma mais grave também são conduzidas ao feto. Finalmente, e para mim o maior e mais significativo dos riscos, é o facto de poder ocorrer um bloqueio a nível dos neurossensores rectais e que desta forma suprime a sensação de puxo às mulheres durante o período expulsivo.
Este risco requer uma maior atenção até porque as desvantagens que acarreta podem ser muitas e de gravidade acrescida. A natureza deu à mulher e ao homem uns neurossensores, que funcionam com o aumento da pressão e colocou-os fundamentalmente a nível rectal e vesical. Por isso quando chegam as fezes ao recto ou quando a bexiga fica cheia, a pessoa tem a respectiva sensação de defecar ou urinar. Na mulher em trabalho de parto, este neurossensores dão as informações à mulher que quando a cabeça do bebé está a descer na vagina ela terá que fazer forças expulsivas (iguais às de defecar), exactamente para colocar o bebé fora do seu organismo. E estas sensações são mais fortes à medida que o bebé desce (é por isso que muitas mulheres tem o bebé na ambulância antes de chegar à maternidade, ou até na cama antes de ser "colocada em posição". Ora uma mulher bloqueada, deixa de ter esta sensação de puxo, porque também ele é uma sensação e como à dor, logo sensorial, logo, a mulher por mais vontade que tenha em colaborar, não consegue porque foi castrada nesta sua competência, isto é foi-lhe anulada esta sua capacidade. Então o que é que acontece? um bebé preso na pélvis materna, sem descer, tem que se fazer com que ele desça. Como? com a aplicação de forceps ou ventosas. E isto pode trazer outras complicações, a curto, médio e a longo prazo quer para a mãe, quer para o bebé. No limite, pode-se dizer que aquela mulher que lhe tiraram a dor durante alguns pares de horas, podem ter-lhe arranjado uma para o resto da vida com uma dependência permanente do médico e de cuidados médicos.
Explicando ainda melhor, quando se colocam instrumentos num local preparado para no limite suportar, em termos de distensão, a passagem de uma cabeça de um bebé, obriga-se a distender mais para suportar mais uns forcéps ou ventosa, que na sequência dinâmica de puxar o bebé pode causar lesões extensas da parede vaginal (lacerações vaginais) que podem ir até ao colo uterino e até lesar este orgão, assim como podem lesar estruturas adjacentes como seja o caso da bexiga e recto. Não estou ainda a falar da episiotomia que fica para uma outra altura. Mais, uma mulher com a dor bloqueada, não reage à colocação destes instrumentos, que assim podem ser colocados em patamares superiores (apesar de se advogar que não é possível), do que podem resultar, por isso, em lesões mais extensas e profundas. Para não falar na possibilidade de lesão que estes instrumentos podem provocar na cabeça frágil de um bebé (e todos podem imaginar o cuidado com que se pega num bebé para não magoar a cabeça, por exemplo a dar banho), uma lesão pode ser resultante da pressão exercida por duas colheres opostas ou pode ser resultante do vácuo exercido sobre a calote craneana do bebé.
Para não falar dos "agradáveis" comentários que se é obrigado a ouvir como "já não há mulheres como antigamente que não conseguem parir os próprios filhos" ou "nem fazer força sabem".
Assim, gostava neste espaço de deixar dois alertas. Um alerta para que se pensasse melhor antes de se tomarem atitudes levianas e sem sustento informativo, na medida que pode trazer dissabores para o resto da vida. O outro para a desinformação que se deixa a mulher, porque ela estando desinformada, deixa-se levar, confiante que lhe estão a dizer a verdade e não consegue debater estes conceitos, quantas vezes já não se ouviu esta expressão "o que é que interessa isso, faço-lhe um parto sem dor e isso sim é que é importante".
Nunca se interrogaram, porque é que hoje temos que 65% (números por baixo) dos partos que ocorrem na maternidade/hospital são distócicos (isto é ventosas, forceps e cesarianas)? e porque é que estas taxas aparecem sobretudo na última década? Será que a mulher deixou de ter competências para ter um bebé nos últimos 10 anos? porque antigamente tinham filhos e muitas das vezes mais de 10 (também sei da implicação dos métodos de planeamento familiar nos dias de hoje) e não haviam problemas e hoje nem um quase conseguem ter? a resposta é simples deve-se à crescente implementação do bloqueio epidural. Os anestesistas, principais interessados, não gostam de ouvir isto e tentam desmistificar através de alegados estudos, mas os resultados estão aí e cada vez mais encontramos mulheres despedaçadas e desgraçadamente desgraçadas devido à instrumentalização do nascimento. É de pensar não é?

sexta-feira, 20 de abril de 2007

assertividade

Quem anda por aqui, blogosfera, e que tenha passado por este recanto terá certamente verificado que ele estava despido de conteúdo há já algum tempo.
A verdade veio ao de cimo como o cruzamento entre a água e o azeite. Isto é a relação entre disponibilidade e vontade estão na inversa proporção.
Durante este tempo estive ausente, também, porque alguns dos casais grávidos que acompanho chegaram ao fim do tempo de gestação. O que quer dizer rigorosamente o mesmo que tive de dispor de tempo para ajudar estes casais a receber o seu novo rebento. Resultante desta minha interacção emerge exactamente esta postagem e o seu titulo diz tudo. A assertividade.
Apesar de ser um defensor incondicional do parto domiciliar por muitas das coisas que já foram descritas e por outras que serão descritas (conforme desejo), neste período senti a necessidade de editar esta postagem. E porquê? Por uma razão muito simples. É que tendo em conta que os dois princípios pelos quais se rege a humanização do nascimento, segurança e respeito à mulher/casal/família, estes nunca deverão em algum momento serem descurados sob risco de causar danos que poderão ser irreversíveis.
A presença de um obstetra (enfermeira ou médica) prende-se exactamente por isto, a avaliação continua do desenrolar daquele trabalho de parto e parto. E em alguma ocasião deve balançar entre decisões que poderão ser importantes no final deste processo de acompanhamento. A assertividade deve ser o rumo do profissional que acompanha um parto domiciliar porque desta atitude resulta um acréscimo de profissionalismo e desta forma um reforço da confiança entre os diferentes agentes ou participantes deste evento.
Da mesma forma que acredito, traduzido pelas inúmeras evidências cientificas, que o parto domiciliar é sem sombra de dúvidas muito mais seguro, no contexto actual, do que o parto no meio hospitalar, também acredito nos resultados obtidos pela relação profissionalizante sustentada pela honestidade e sinceridade. Este é um bastião de abrigo para todo o verdadeiro profissional.
Assim, quem decide optar por um parto domiciliar deve exigir e deve ser assumido o compromisso do principio da segurança independentemente do desfecho que tal possa encerrar, isto é o encaminhamento para um centro obstétrico.
Assim teremos ganhos quer em termos de satisfação quer em termos de resultados.
Fiquem bem