segunda-feira, 18 de agosto de 2008

EPIDURAL um lobo com pele de cordeiro

A epidural foi recentemente introduzida no mundo da obstetrícia como se dele fizesse parte integrante desde todos os tempos. Mas será que ela é de facto benéfica para a mulher em trabalho de parto, para o parto em si e para o bebé? Não, antes pelo contrário. Então a quem é que ela beneficia fundamentalmente? Em primeiro os profissionais de saúde, mas também a indústria farmacêutica.
Aos profissionais obstetras é-lhes altamente benéfico ter uma mulher calada, sossegada, que não reclame, porque desta forma os libertam para outras actividades acessórias. Uma mulher que exige e reclama cuidados, que manifesta desconfortos vários, que está inquieta, obrigada a permanecer deitada, que não pode manifestar desejos e que se vê obrigada a aceder aos inúmeros profissionais, incomoda.
Aos anestesistas, elemento estranho mas cada vez mais protagonista no processo do nascimento humano, foi-lhe atribuído um campo privilegiado de treino. Não sendo a epidural uma prática tão generalizada nas cirurgias comuns praticadas pelos hospitais, conseguiu-se assim massa humana, as parturientes, para que estes profissionais possam de forma ininterrupta desenvolver as habilidades profissionais que se traduz, neste caso, em conseguir colocar um cateter entre duas membranas. Não interessa, por ventura, referir as múltiplas abordagens ao local, através de incontáveis picadelas nas costas da mulher que ela não vê (por força da sua posição) nem sente (por força de anestesia local previamente feita), ou as punções da dura com saída de líquido cefalo-raquideo e as consequentes dores de cabeça persistentes durante um longo período após o parto, ou de eventuais hemorragias junto da inserção do cateter, ou os desvios do próprio cateter epidural quando da sua introdução, ou das reacções com os fármacos anestésicos utilizados ou ainda das sequelas futuras através de queloides cicatriciais pós epidural provocando dores semelhantes às das hérnias discais. De referir ainda as inúmeras vezes que este procedimento é “falhado” (insucesso associado à técnica cega) e por isso obriga à sua repetição com mais gastos de materiais e drogas para além dos desconfortos acrescidos à parturiente.
A epidural permite também, aos anestesistas, o estudo do comportamento das drogas utilizadas neste processo intervencionista. Com os eventuais efeitos colaterais que essas drogas possam produzir, abre a possibilidade de se estudarem e manusearem outras que possam atenuar os efeitos indesejáveis.
Na clínica privada, o anestesista, é mais um entre muitos que vai repartir o bolo resultante do pagamento feito pela mulher ou seguradoras.
A indústria farmacêutica é também parte interessada neste jogo porque através da venda dos indispensáveis kits de agulhas e seringas, para além das drogas anestésicas, engordam ainda mais os seus cofres. São muitos os milhares de euros movimentados através deste procedimento médico, que por sua vez alimenta um universo de interesses farmacêuticos. As contrapartidas aos profissionais são os sempre apetitosos brindes ou outras formas compensatórias, por todos conhecidos mas nunca ou raramente provados.
E a mulher? Ela é o que menos conta neste enredo de interesses. Serve todos os fins mas raramente tira proveito da sua mais nobre experiência de vida. É mantida calada, castrada em todas as suas competências, bloqueada, inibida de exprimir sentimentos e sensações, mas principalmente é-lhe retirada a capacidade de ser mulher e mãe. Os 70% de partos distócicos que acontecem hoje nas maternidades portuguesas são certamente de causa multifactorial que vão desde a utilização abusiva de drogas indutoras e uterotónicas (que aumentam a intensidade e frequência das contracções), passando pelo posicionamento incorrecto mas contínuo da mulher durante o trabalho de parto e parto e terminando pelas inúmeras intervenções. E para isto tudo a epidural veio dar um contributo significativo através da sua acção bloqueadora e ao mesmo tempo castradora de competências.
Todos os estudos internacionais publicados nas mais diversas bibliotecas tais como a cochrane e a publimed atribuem uma forte correlação positiva entre o uso do bloqueio epidural no trabalho de parto e o parto distócico. Não porque ela vá interferir directamente no parto, mas sim porque permite que os profissionais possam intervir de forma abusiva durante todo o processo de nascer quer pelo uso de drogas quer através de procedimentos agressivos, já que a mulher não tem capacidade para responder. A troco de algumas horas sem percepção álgica e outras sensações inerentes ao nascimento da sua cria, a mulher entrega assim o seu destino e o do seu filho às mãos de profissionais que com mais ou menos habilidades podem estar a hipotecar o bem-estar futuro de um e/ou do outro. As consequências inerentes aos procedimentos obstétricos intervencionistas podem ser múltiplos e estão bem descritos mas isso pouco parece interessar até porque nesta fase a mulher passa a ser um mero objecto de estudo e de intervenção por parte dos múltiplos profissionais. Hoje cada vez mais se vem mulheres jovens em consultas médicas de ginecologia, cirurgia geral, plástica (para vulvoplastias, vaginoplastias, perineoplastias, etc.) como consequência dos procedimentos obstétricos agressivos executados assim como as crianças que se multiplicam por consultas do foro neurológico.
Daí que a epidural não sendo um processo intrínseco à obstetrícia, assumiu um protagonismo até há bem pouco tempo inimaginável e com tamanhas consequências nefastas quer para a mulher quer para a criança. Por isso um verdadeiro lobo com pele de cordeiro.
Dá que pensar não dá?