sexta-feira, 12 de setembro de 2008

ENCONTRO SOBRE PARTO HUMANIZADO

Vai realizar-se na Casa do Rio no Porto, dia 21 de Setembro um encontro que versa o tema "PARTO HUMANIZADO E HUMANIZAÇÃO DO NASCIMENTO". Um encontro abrangente sobre esta temática relacionada com o processo do nascimento.
INFORMAÇÕES E INSCRIÇÕES até 19 de setembro

CRISTINA GOMES - 934 371 888 / cristinacgomes@gmail.com
MARIA MOURA - 917 582 364 / acasadorio@gmail.com

Investimento: 10 €
(inclui certificado de participação e dossier com informação
pertinente sobre o tema)

Junto à Pousada da Juventude,
autocarros mesmo ao lado: 207 e 504.
Um pouquinho mais longe o 200, 202, 204, 500.
Rua Gaspar Correia, n.º 303
4150-346 Foz – Porto


Compareçam.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

EPIDURAL um lobo com pele de cordeiro

A epidural foi recentemente introduzida no mundo da obstetrícia como se dele fizesse parte integrante desde todos os tempos. Mas será que ela é de facto benéfica para a mulher em trabalho de parto, para o parto em si e para o bebé? Não, antes pelo contrário. Então a quem é que ela beneficia fundamentalmente? Em primeiro os profissionais de saúde, mas também a indústria farmacêutica.
Aos profissionais obstetras é-lhes altamente benéfico ter uma mulher calada, sossegada, que não reclame, porque desta forma os libertam para outras actividades acessórias. Uma mulher que exige e reclama cuidados, que manifesta desconfortos vários, que está inquieta, obrigada a permanecer deitada, que não pode manifestar desejos e que se vê obrigada a aceder aos inúmeros profissionais, incomoda.
Aos anestesistas, elemento estranho mas cada vez mais protagonista no processo do nascimento humano, foi-lhe atribuído um campo privilegiado de treino. Não sendo a epidural uma prática tão generalizada nas cirurgias comuns praticadas pelos hospitais, conseguiu-se assim massa humana, as parturientes, para que estes profissionais possam de forma ininterrupta desenvolver as habilidades profissionais que se traduz, neste caso, em conseguir colocar um cateter entre duas membranas. Não interessa, por ventura, referir as múltiplas abordagens ao local, através de incontáveis picadelas nas costas da mulher que ela não vê (por força da sua posição) nem sente (por força de anestesia local previamente feita), ou as punções da dura com saída de líquido cefalo-raquideo e as consequentes dores de cabeça persistentes durante um longo período após o parto, ou de eventuais hemorragias junto da inserção do cateter, ou os desvios do próprio cateter epidural quando da sua introdução, ou das reacções com os fármacos anestésicos utilizados ou ainda das sequelas futuras através de queloides cicatriciais pós epidural provocando dores semelhantes às das hérnias discais. De referir ainda as inúmeras vezes que este procedimento é “falhado” (insucesso associado à técnica cega) e por isso obriga à sua repetição com mais gastos de materiais e drogas para além dos desconfortos acrescidos à parturiente.
A epidural permite também, aos anestesistas, o estudo do comportamento das drogas utilizadas neste processo intervencionista. Com os eventuais efeitos colaterais que essas drogas possam produzir, abre a possibilidade de se estudarem e manusearem outras que possam atenuar os efeitos indesejáveis.
Na clínica privada, o anestesista, é mais um entre muitos que vai repartir o bolo resultante do pagamento feito pela mulher ou seguradoras.
A indústria farmacêutica é também parte interessada neste jogo porque através da venda dos indispensáveis kits de agulhas e seringas, para além das drogas anestésicas, engordam ainda mais os seus cofres. São muitos os milhares de euros movimentados através deste procedimento médico, que por sua vez alimenta um universo de interesses farmacêuticos. As contrapartidas aos profissionais são os sempre apetitosos brindes ou outras formas compensatórias, por todos conhecidos mas nunca ou raramente provados.
E a mulher? Ela é o que menos conta neste enredo de interesses. Serve todos os fins mas raramente tira proveito da sua mais nobre experiência de vida. É mantida calada, castrada em todas as suas competências, bloqueada, inibida de exprimir sentimentos e sensações, mas principalmente é-lhe retirada a capacidade de ser mulher e mãe. Os 70% de partos distócicos que acontecem hoje nas maternidades portuguesas são certamente de causa multifactorial que vão desde a utilização abusiva de drogas indutoras e uterotónicas (que aumentam a intensidade e frequência das contracções), passando pelo posicionamento incorrecto mas contínuo da mulher durante o trabalho de parto e parto e terminando pelas inúmeras intervenções. E para isto tudo a epidural veio dar um contributo significativo através da sua acção bloqueadora e ao mesmo tempo castradora de competências.
Todos os estudos internacionais publicados nas mais diversas bibliotecas tais como a cochrane e a publimed atribuem uma forte correlação positiva entre o uso do bloqueio epidural no trabalho de parto e o parto distócico. Não porque ela vá interferir directamente no parto, mas sim porque permite que os profissionais possam intervir de forma abusiva durante todo o processo de nascer quer pelo uso de drogas quer através de procedimentos agressivos, já que a mulher não tem capacidade para responder. A troco de algumas horas sem percepção álgica e outras sensações inerentes ao nascimento da sua cria, a mulher entrega assim o seu destino e o do seu filho às mãos de profissionais que com mais ou menos habilidades podem estar a hipotecar o bem-estar futuro de um e/ou do outro. As consequências inerentes aos procedimentos obstétricos intervencionistas podem ser múltiplos e estão bem descritos mas isso pouco parece interessar até porque nesta fase a mulher passa a ser um mero objecto de estudo e de intervenção por parte dos múltiplos profissionais. Hoje cada vez mais se vem mulheres jovens em consultas médicas de ginecologia, cirurgia geral, plástica (para vulvoplastias, vaginoplastias, perineoplastias, etc.) como consequência dos procedimentos obstétricos agressivos executados assim como as crianças que se multiplicam por consultas do foro neurológico.
Daí que a epidural não sendo um processo intrínseco à obstetrícia, assumiu um protagonismo até há bem pouco tempo inimaginável e com tamanhas consequências nefastas quer para a mulher quer para a criança. Por isso um verdadeiro lobo com pele de cordeiro.
Dá que pensar não dá?

sábado, 5 de abril de 2008

CANTO DA SEREIA 2 - OS FOLHETOS

Resolvi voltar à reflexão do canto da sereia para abordar outra vertente que igualmente considero importante no sentido de constituir mais um alerta para as mulheres com necessidades de cuidados obstétricos.
Conforme foi dito na reflexão canto da sereia, há estratégias para difusão de queres institucionais ou profissionais que são criadas através da utilização de argumentações bem elaboradas, entoadas de forma harmoniosa, mas fundamentalmente feitas para não serem contestadas.
Da minha prática clínica diária, quando questiono habitualmente a mulher se está na posse de todos os dados referentes aos diferentes procedimentos a que pode estar sujeita quando internada, se conhece as vantagens, desvantagens e riscos das diferentes práticas, a resposta invariavelmente vai-se tornando a mesma: sim, já li os folhetos várias vezes.
O folheto.
O folheto, panfleto ou brochura representam hoje um dos mais importantes veículos de informação das diferentes instituições e sectores, sendo por isso, provavelmente, uma das formas mais persuasivas que existe para se conseguirem os diferentes intentos. Quem é que ainda não entrou dentro de uma maternidade ou hospital e não viu espalhados pelas mesas os mais diversos e diferentes folhetos? Quem é que ainda não foi ás consultas de vigilância da gravidez e não lhe é oferecido um ou mais folhetos sobre as mais diversas áreas temáticas?
É por isso que muitas mulheres na ânsia de tentarem encontrar respostas para as suas dúvidas, buscam aqui a informação que provavelmente necessitam e que julgam ser completa e isenta para assim se sentirem preparadas para enfrentarem os futuros desafios. Até aqui tudo seria perfeito se estas ferramentas de facto fossem construídas de forma equilibrada, séria e abrangente.
Mas o que se verifica afinal? Acontece que estes folhetos, elaborados pelas diferentes unidades/sectores hospitalares têm embutidos a visão cooperativista daquela ou daquelas unidades e veiculam assim, de forma natural, a visão que mais convém para aquela área específica. Outros folhetos são feitos por grupos de estudantes que no intuito de dar resposta aos respectivos planos curriculares constroem brochuras/panfletos sob a supervisão escolar e muitas vezes desenquadradas das necessidades da mulher. No fundo, todos se acham capazes de elaborarem informações escritas focando apenas e estritamente a sua área de actuação. Não é mais do que a visão médica actual que divide o ser humanos em partes ou unidades, esquecendo a interacção do seu todo, isto é, a visão humanista e holista do ser humano
Elaborados com frases simples e de fácil assimilação, de cores agradáveis e discurso apelativo, constituem, assim, de forma simples e rápida a maneira fácil de atingir os quereres dos interesses institucionais. Estas ferramentas contêm, na sua grande maioria, aquilo que os próprios profissionais consideram importantes para eles e aquilo que eles também consideram que servem melhor para as suas práticas. Veiculam informação de forma objectiva e concisa no sentido de determinar o que é que as mulheres devem ter, possuir, levar, fazer e comportar. Enaltecem vantagens de procedimentos que se sabe comportar riscos importantes para a mulher e criam-se assim esperanças de ofertas paradisíacas. No fundo, vinculam a mulher a comportamentos padronizados, modelam formas de estar e de relacionamentos e bloqueiam o sentido crítico das utentes.
Com esta forma de canto da sereia, as mulheres estabelecem um vínculo afectivo com estes folhetos e incorporam-nos como instrumentos fundamentais e orientadores de futuros comportamentos, acabando por terminar muitas vezes com desfechos muito desagradáveis para aquela mulher, bebé e família. Para os profissionais, também estes instrumentos servem os respectivos interesses porque por um lado facilita a difusão da sua mensagem e garantem que ela chega, de facto, ao público-alvo e por outro consideram estar completo e bem feito o seu trabalho no abrangente processo do cuidar.

sexta-feira, 7 de março de 2008

porque fogem as mulheres da anestesia no parto

Mais um artigo interessante da revista Pais e Filhos do Brasil e que se enquadra na temática deste blogue. Deixo aqui para quem se interessar sobre o que se pensa em outras paragens.
Quando passou a ser usada para aliviar as dores do parto, no século 19, a anestesia foi comemorada como uma conquista feminina. Hoje, mais e mais mulheres optam por dar à luz sem ela. A gente foi investigar por quê.
No mundo todo cresce o número de mulheres que optam pelo parto sem anestesia. No Brasil, um dos campeões mundiais em cesariana, os índices ainda são pequenos, visto que, óbvio, a anestesia só pode ser dispensada no parto vaginal. Ainda assim, cada vez mais mães que buscam o parto natural, com o mínimo de intervenção médica, dispensam a dor da picada e enfrentam a das contrações, da dilatação e da expulsão do bebê. Onde quem opta pela cesariana, temendo o parto normal, vê dor, as mães que evitam a anestesia enxergam prazer. Segundo elas, sentir o nascimento do filho é uma delícia. Para algumas, comparável a um orgasmo.
No livro As 500 Melhores Coisas de Ser Mãe, das publicitárias Juliana Sampaio e Laura Guimarães, autoras do blog que virou programa de TV Mothern, a 29ª melhor descoberta da maternidade é “reconhecer o valor de ter nascido após a invenção da anestesia”; e a 30ª, “ou encarar um parto natural sem isso e descobrir-se mais forte e poderosa do que você jamais se imaginou”. Ou seja, questão de opção. Ninguém é mais mãe por sentir dor, claaaaro. Nem precisava dizer, mas a gente faz questão.
Na primeira vez que a anestesia foi usada com esse fim, corria o século 19. A rainha Vitória deu à luz seu oitavo filho sob efeito do clorofórmio. A peridural, usada até hoje, surgiria só no século 20. No Brasil, o governo passou a pagar ao SUS pela anestesia dada no parto normal apenas a partir de 1998. Na Europa, em geral, as anestesias continuam sendo evitadas. Em outros países, como Espanha, Portugal e nos Estados Unidos, são usadas de forma liberada, mas também cresce o movimento por menos intervenções.
Entre as razões citadas pelas mães para evitar a anestesia estão o desejo de perceber o momento em que os bebês nascem, sentir prazer durante o parto, evitar que os bebês tenham contato com os anestésicos e ter maior mobilidade para amamentar. Segundo o neonatologista Carlos Eduardo de Carvalho Corrêa, filho de Victor e Silma, um procedimento sem anestesia estabelece rapidamente o vínculo materno. Ele cita estudos que mostram que bebês nascidos de partos sem a necessidade de anestesia, ao serem colocados sobre o ventre da mãe, logo após o nascimento, fazem um movimento em direção ao peito materno, o que não acontece com bebês nascidos sob intervenções anestésicas.
- Diminuindo a dor:
Mas como conseguir tudo isso? Uma das respostas é recorrendo ao apoio de uma doula, acompanhante de parto que, além de dar apoio e incentivo na hora mais dolorida, ensina técnicas de respiração que ajudam a diminuir o desconforto. A presença dessa profissional, segundo dados da OMS (Organização Mundial da Saúde), diminui em cerca de 60% os pedidos de anestesia. Claro que fica muito complicado não fazer nenhuma preparação prévia e querer ter o filho a seco na hora...
Segundo a doula Cristina Balzano, mãe de Mônica, Miguel e João Pedro, o ideal é que a mulher não prenda o ar durante as contrações. “A respiração tranqüila, pelo abdômen, oxigena também melhor o bebê”, explica. Outras dicas são a escolha da melhor posição, que é individual para cada mulher, massagens e o contato com a água, seja numa banheira, ducha ou com compressas, já que, diz Cristina, a água é um excelente analgésico natural.
Foi a água que auxiliou Mariana Betioli, mãe de André. Compressas feitas nas costas ajudaram no trabalho de parto. “Queria sentir cada momento lúcida, à vontade e segura”. Já Daniela Aragão, mãe de Pedro, Bernardo e Julia, teve os três filhos em partos normais: o primeiro com anestesia; os outros dois, sem. Para ela, não há comparação. “Prefiro quando tenho controle e sei a hora em que tenho de fazer força. Trabalhar em sintonia com o bebê foi a melhor sensação que já vivenciei”.
O próprio organismo se encarrega de produzir substâncias que contribuem para aliviar a dor. “O trabalho de parto oferece as ferramentas para diminuir as sensações dolorosas, produzindo um incremento fantástico nas endorfinas (substâncias conhecidas como “analgésicos do cérebro”)”, diz o obstetra e homeopata Ricardo Herbert Jones, pai de Lucas e Isabel, que relata, no livro Memórias do Homem de Vidro, sua opinião sobre o tema. A incidência das anestesias nos partos que acompanha é de quase zero.
O cérebro tem um poder tão fantástico que basta a gente acreditar que não vai mais sentir dor para ter algum alívio. Segundo um estudo feito na Universidade de Michigan, nos EUA, a simples menção de que iriam receber um anestésico fez com que pacientes que tinham tomado uma substância causadora de dor registrassem um aumento na produção de endorfinas. Acontece que a substância não passava de um placebo, sem efeito nenhum.
- O direito à mudança:
Mas é claro que você não precisa ser radical. É sempre muito bom saber que a gente pode optar pela anestesia se, na hora H, a dor for demais. Heather, mãe de Emily, Lucas, Logan e Anna Elisa, durante sua gravidez mais recente, não queria anestesia de jeito nenhum. Mas, na hora, a dor ficou forte demais. “Estava além do meu limite. Com certeza, a anestesia ajudou.”
O obstetra e acupunturista Marcos José Pires, pai de Leonardo e Nathalia, acredita que a analgesia de parto, se aplicada no momento certo, isto é, quando as contrações ficam mais fortes entre 6 cm e 8 cm de dilatação (o total é de 10 cm de dilatação do colo do útero, quando o bebê nasce), pode garantir que a gestante tenha um parto normal. “Já no início do pré-natal, a mulher se preocupa com a dor. Sabendo da possibilidade de um procedimento que melhore bem essa dor, elas ficam mais estimuladas a tentar o parto normal”.
E, acredite: depois da picada, você realmente não sente nada. É um alívio e tanto quando a coisa começa a ficar insuportável para os padrões de algumas mulheres. Nada de bancar a heroína, não é essa a idéia.
Segundo o obstetra, que também usa a acupuntura para aliviar a dor, a analgesia atua melhorando a evolução do parto normal, facilitando a descida do bebê e a dilatação. Mas o médico alerta que isso só acontece se for feita no momento adequado, com acompanhamento do obstetra e com anestesista experiente. Caso contrário, ela pode favorecer uma parada das contrações uterinas e dificultar a dilatação, aumentando o risco de cesariana.
A Dra. Daphne Rattner, filha de Heinrich e Miriam, técnica da área de Saúde da Mulher do Ministério da Saúde, acredita que mulheres que, sentindo-se bem acolhidas, acompanhadas por pessoas de suas relações e profissionais que lhe inspiram confiança conseguem, muitas vezes, controlar as contrações e até não sentir a dor. Porém, quando essas condições não ocorrem, aumenta a tensão e, conseqüentemente, a dor. Daí a importância da anestesia. O melhor é não fazer nada contra a vontade. A sua, óbvio. Se achar que não precisa, tente sem. Se achar que precisa, peça e pronto. Doa a quem doer. Só não pode doer mais do que você consegue (e quer) suportar

porque optam hoje as mulheres por parir em casa

Achei interessante esta noticia que saiu na revista Pais e Filhos em 2006, mas que só agora tive conhecimento e aqui deixo para conhecimento de todos, porque penso que se mantém actualizado e desejavel.
É mais antigo do que andar para a frente e até por isso o parto em casa, hoje em dia, assusta tanta gente. Com toda a segurança, tecnologia e infra-estrutura das maternidades, pode parecer maluquice. Mas quem já fez garante que a experiência é inigualável.
Em vez da sala de parto e o quarto do hospital, o conforto da própria casa. No lugar de médicos e enfermeiras de luvas e aventais, uma parteira. Nada de anestesia, cortes ou procedimentos invasivos, mas, sim, uma experiência mais natural do nascimento. O parto feito em casa, também chamado de domiciliar, causa estranheza, gera medo e parece ser coisa de gente maluca. Porém, essa foi a regra que vigorou durante muitas décadas, até meados dos anos 50, e cada vez mais tem conquistado a mulherada dos dias de hoje. E tem mais: é seguro, a probabilidade de infecção é menor e o vínculo que se estabelece com o bebê é muito maior.
“Hoje respiramos uma cultura hospitalar. Para quem mora nas grandes cidades e vive esta época, ter um parto em casa é inconcebível, é coisa de índio, de bicho”, relata a enfermeiraobstetra Vilma Nishi, mãe de Carolina e Luisa. De acordo com ela, as mulheres que se interessam pelo parto em casa têm a característica de serem mais ligadas à natureza e, de alguma forma, procuram realizar o desejo de vivenciar um processo mais natural. “Se engravidamos naturalmente, deve haver um jeito natural também de darmos à luz”, diz a parteira.
Na consulta inicial, as parteiras conhecem a história dos pais e seus desejos. O pré-natal continua sendo feito por um médico, que acompanha as condições de saúde da mãe e o desenvolvimento do bebê. Com a parteira, a mulher vive outro tipo de experiência, mais ligada às emoções e sensações. Muitas mulheres descrevem as consultas como uma verdadeira terapia. São conversas, massagens e períodos de reflexão.
As pessoas que defendem o parto em casa acreditam que tanto os pais quanto os bebês são beneficiados. Elas dizem que no hospital os médicos colocam a mãe em uma atitude passiva. “A mulher deve ser protagonista do parto. Em casa, ela tem liberdade para escolher a posição que quer ficar, a música que quer ouvir, o que quer comer. O profissional apenas presta uma assistência”, explica a enfermeira-obstetra Marília Largura, de 71 anos, mãe de Paulo, Victor e Sarita.
Marília diz que o primeiro contato do bebê com a equipe médica costuma ser marcado por tensão, nervosismo, excesso de manipulações e verificações. Já em casa, a mãe pode ficar com o filhote durante o tempo que quiser, dar banho, amamentá-lo e curtir os primeiros momentos na tranqüilidade do lar. Outro aspecto positivo, na visão da parteira, é que o parto domiciliar estreita a relação dos pais com as crianças. “Quanto mais partos eu assisto em casa e no hospital, mais eu me convenço de que o lugar mais natural para dar à luz, quando se está sadio, é na própria casa”, explica.
As parteiras rejeitam as afirmações de que o parto em casa traz riscos de infecção tanto para a mulher quanto para a criança. “Em casa a mulher está no seu hábitat, com suas próprias bactérias. As chances de infecções são infinitamente menores”, argumenta Vilma.
- Humanização:
Vilma, uma das parteiras mais conhecidas de São Paulo, construiu sua carreira trabalhando durante quase 30 anos em hospitais. Sua vida mudou em 2001, quando conheceu o trabalho de uma parteira alemã, adepta do parto humanizado. Desde então, Vilma dá assistência às mulheres que têm o sonho de dar à luz em sua própria casa, como fez Claudia d’Orey, mãe de Valentina, 1 ano e 4 meses.
Claudia conheceu a parteira quando estava no quinto mês de gravidez. Ela já havia procurado 15 médicos e não tinha se identificado com nenhum deles. “Me encantei com a Vilma logo na primeira consulta. Em vez dos exames tradicionais, ela fez massagens, conversou muito comigo, me deixou confiante”, descreve a musicista, que, até então, não sabia da possibilidade de dar à luz em casa.
Os quatro meses seguintes foram recheados de consultas, informações sobre o parto e o pós-parto, além das massagens. “Estabelecemos um vínculo muito forte nesse período”, conta Claudia. E, assim que sua bolsa estourou, por volta da 1 hora da madrugada, ela logo ligou para Vilma. A parteira seguiu para a sua casa conforme o combinado. Ao contrário do que muita gente imagina, a casa não precisa ser adaptada para que a mulher dê à luz. As parteiras costumam levar apenas um equipamento para acompanhar a freqüência cardíaca do bebê, tesoura para cortar o cordão umbilical, gaze e algodão. Toalhas e lençóis, por exemplo, não precisam ser esterilizados, já que nenhuma intervenção cirúrgica é feita.
Valentina nasceu perto das 10 horas da manhã. Durante o trabalho de parto, Vilma conversou com Claudia, fez massagens e, nos momentos de dor, passou segurança e tranqüilidade. Como acontece nos partos realizados em casa, a mãe não recebeu nenhum tipo de anestesia nem sofreu procedimentos invasivos. Durante o trabalho de parto, as parteiras indicam posições mais confortáveis, mas deixam a mãe à vontade para decidir onde e como quer ficar. “Nós transmitimos segurança e calma para que a mãe faça o seu papel”, acredita Vilma.
“A Vilma ficou invisível na hora do parto. Ela dizia que era um momento meu, muito íntimo. Entrei em outra sintonia. Uma hora, na sala, fiquei de cócoras e a cabeça do bebê saiu. Em seguida, me deitei no chão e a Valentina nasceu”, conta Claudia. Acompanhada por duas amigas, tudo correu muito bem, mas ela diz que sentiu muita, mas muita dor. E quanto aos preparativos, a coisa não saiu exatamente do jeito que imaginou. Ela havia comprado velas, incenso, escolhido músicas para o momento. “Tinha uma fantasia de como seria, mas na hora foi tudo mais visceral e a dor é muito grande”, conta.
Valentina nasceu e foi para o colo da mãe. A musicista ficou o tempo que quis com ela, ainda ligada pelo cordão umbilical. Só depois é que o bebê foi pesado e medido. Claudia amamentou a filha, e Vilma só foi embora quando a mãe já se sentia segura. Depois, voltou nas duas semanas seguintes, quase que diariamente. Com o tempo, as consultas foram se tornando mais distantes.
Hoje, Claudia enxerga seu parto como um ritual e afirma ter saído fortalecida da experiência. “Existe um mito em torno do parto, mas ele pode ser muito mais simples do que a gente imagina. E tem mais: é uma experiência única, inigualável. Não vou dizer que não senti dor, senti, e muita, mas a recompensa, a sensação depois, é boa demais”, conta.
- Barreiras:
Mas não são todas as mulheres que, mesmo após conhecer a parteira e se identificarem com o trabalho, têm o filho em casa. Muitas vezes elas sofrem críticas de familiares e amigos, e acabam sendo desestimuladas. “Na verdade, não culpo a família nem os amigos pelas desistências. O parto sempre foi e continua sendo um momento de insegurança para a mulher”, relata Marília, que nasceu de parto em casa e auxiliou sua filha a ter os três netos também na residência.
A enfermeira-obstetra conta que a sociedade é tão preconceituosa que há casos de vizinhos que chamam a polícia quando a mãe decide ter o filho em casa. “O mundo ficou muito neurótico”, afirma Marília. Quem critica o parto domiciliar afirma que, em caso de emergência, tanto a mãe quanto o bebê ficam desamparados. Mas, de acordo com Vilma, ao primeiro sinal de que algo pode dar errado, a mulher e o recém-nascido são levados rapidamente para um hospital próximo.
A jornalista Joanna Savaglia, mãe de Rodrigo e Marina, enfrentou de perto o preconceito. Quando estava grávida da Marina, foi atrás de informações sobre parto em casa. Ela conta que no parto do Rodrigo não estava bem-informada sobre as possibilidades e acabou fazendo no hospital.
No sétimo mês de gravidez, Joanna decidiu ter Marina em casa. “Meu marido era contra, mas estava fácil de convencê-lo.” A situação mudou quando a jornalista contou para colegas de trabalho que iria ter a filha na própria residência. “Elas me acharam maluca. Minha chefe telefonou para o meu marido e disse que era uma doideira o que eu queria fazer”, relata.
O pai ficou inseguro e, como Joanna queria tê-lo ao seu lado na hora do parto, optou pelo hospital. No entanto, procurou um meio-termo. O parto foi realizado em um hospital, mas com uma parteira. Mas o sonho de dar à luz em casa ainda não foi abandonado: “Quem sabe eu não tenho um terceiro filho?”, termina.

domingo, 23 de dezembro de 2007

Canto da Sereia

Todos se lembram de muitas das lendas que nos contavam como forma de acelerar o adormecimento e que povoam ainda hoje o nosso imaginário. Dessas, o canto da sereia, remetia-nos sobre forma de aviso para os perigos dos encantamentos. Quem nunca ouviu contar histórias de marinheiros que ao escutarem o canto da sereia se deixavam embalar pelo mesmo e assim eram conduzidos de forma hipnotizada para as profundezas dos oceanos.
Os leitores desta reflexão poderão colocar então a seguinte pergunta: o que tem o canto da sereia a ver com esta questão da obstetrícia e do parto em si? Como resposta pretende-se criar a alusão relativamente aos perigos escondidos pelos belos encantos que se ouvem sobre a facilidade, leveza, analgesia e descontracção do trabalho de parto e parto nos contextos actuais, mas fundamentalmente em relação às supostas seguranças oferecidas pelos profissionais relativamente às instituições, procedimentos e aparelhagens.
Hoje, a mulher, quando grávida, começa a ser seduzida por um discurso todo ele muito sustentado na agradabilidade acústica traduzida pela utilização dos “inho(s)” e “inha(s)”. Expressões como: “uma ajudinha”, “um jeitinho”, “um sorinho”, “uma piquinha com uma agulhinha”, “uma horinha pequenina”, etc, fazem parte do discurso standartizado na relação que se estabelece entre os profissionais e as grávidas desde o primeiro encontro. De forma quase natural e também necessária são omitidas algumas referências a desvantagens e riscos dos contextos abordados.
O encantamento que este tipo de discurso produz na mulher grávida, leva-a a aceitar sem discussões e inquietações os inúmeros procedimentos e intervenções praticados pelos profissionais das instituições que por sua vez as conduzem para uma viagem com possíveis consequências. Algumas de tal forma graves que marcam aquela mulher, ou bebé ou ambos para o resto da vida. O encantamento do canto, muito ao estilo do canto da sereia, transporta a mulher e respectiva família para procedimentos e intervenções cada vez mais agressivos que podem culminar com desfechos frustrantes quer para a mulher, que vê defraudada, em muitas das situações, o sonho do nascimento do seu filho num ambiente rodeado de paz e tranquilidade, quer para os profissionais, traduzidas pelas altas taxas de partos instrumentados através de ventosas e fórceps ou de partos cirúrgicos designados por cesarianas. Com partos altamente intervencionados, o canto da sereia continua a impregnar a consciência destas mulheres para a desculpabilização dos actos então praticados e das suas consequências sustentando-se na dramatização do parto como evento. Já nem me refiro à desconsideração que à posteriori estas mulheres sofrem através da frieza das relações institucionais.
Daí esta necessidade sentida, de estalar os dedos à mulher embalada pelo encantamento do canto e fazê-la despertar para a tomada de consciência das suas opções e aceitações no sentido de não se entregar de forma gratuita às múltiplas decisões tomadas por outros intervenientes que não os dela e da família para o nascimento daquela criança.
Com esta reflexão surge a pergunta: deve-se então acabar com as instituições obstétricas? A resposta obviamente é NÃO. E não porque elas devem coexistir em parceria com o desenvolvimento técnico-cientifico e estarem devidamente equipadas e apetrechadas através da tecnologia e profissionais capazes e competentes para darem a resposta efectiva, rápida e adequada para aquelas gravidezes que por um ou outro motivo fogem dos parâmetros considerados fisiológicos ou normais e assumem um perfil de patogenecidade ou doença. Neste âmbito, e só neste, devem contar com a destreza e competência técnica e profissional de todos os quantos ali trabalham e devem contar igualmente com o auxílio da tecnologia no sentido de avaliações contínuas das alterações surgidas. Assim, deve-se evitar a transformação daquilo que é normal em doença, evitar a visão centralizada nos órgãos humanos cada um por si e deve-se sim olhar para a pessoa como um todo, um ser biológico, holistico e carregado de profundas marcas sócio-culturais.
Como complemento de leitura deste apontamento, proponho a leitura das reflexões “epidural” e “indução” que também constam deste blogue.
Tenham por isso atenção e evitem o canto da sereia.

Estou de volta e Boas Festas

Quero mais uma vez pedir desculpas por esta ausência, motivada por compromissos que me impediram de vir colocar reflexões com a frequência que desejava.
Tentarei ser mais assiduo.
Gostava também desejar a todos quantos por aqui passassam e se dão à leitura destes apontamentos, um feliz natal e que 2008 seja um ano repleto de coisas boas.
Desejo igualmente gravidezes mais vivenciadas e livres de intervenções desnecessárias.